quinta-feira, 11 de novembro de 2010

11.11.10 S. Martinho

Quentes e boas

Dia de São Martinho e de muito mais.
Para além das castanhas e da água-pé houve também, empadas, pão de queijo e bom vinho. Havia muito mais coisas, mas já não deu para experimentar. A mesa era farta e o convívio foi diferente e variado. As gerações misturaram-se, as conversas cruzaram-se. Saltavam conversas nostálgicas, histórias antigas, desenterraram-se mitos, ouviram-se confissões. Estes encontros são sempre positivos, junta-se o Céu aqui na Terra e vivem-se momentos únicos.

"Invejo – mas não sei se invejo – aqueles de quem se pode escrever uma biografia, ou que podem escrever a própria. Nestas impressões sem nexo, nem desejo de nexo, narro indiferentemente a minha autobiografia sem factos, a minha história sem vida. São as minhas Confissões, e, se nelas nada digo, é que nada tenho que dizer.
Que há-de alguém confessar que valha ou que sirva? O que nos sucedeu, ou sucedeu a toda a gente ou só a nós; num caso não é novidade, e no outro não é de compreender. Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto. Faço férias das sensações. Compreendo bem as bordadoras por mágoa e as que fazem meia porque há vida. Minha tia velha fazia paciências durante o infinito do serão. Estas confissões de sentir são paciências minhas. Não as interpreto, como quem usasse cartas para saber o destino. Não as ausculto, porque nas paciências as cartas não têm propriamente valia. Desenrolo-me como uma meada multicolor, ou faço comigo figuras de cordel, como as que se tecem nas mãos espetadas e se passam de umas crianças para as outras. Cuido só de que o polegar não falhe o laço que lhe compete. Depois viro a mão e a imagem fica diferente. E recomeço"

(Fernando Pessoa - Livro do Desassossego) 

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